Por que falar de ócio?
[...] Diante do mundo de evasão, distração espetáculo que nos rodeia, o ser humano se torna cada vez mais limitado, cada vez mais dependente das máquinas, menos ator e mais espectador de uma realidade irreal. Falar de ócio se transforma neste contexto, num questionamento de cada um consigo mesmo, de como ser um pouco mais livre para fazer o que se quer. (...) a vivência de ócio é uma experiência que nos ajuda a nos realizar, nos conhecer, nos identificar, nos sentir melhores, sair da rotina, fantasiar e recuperar o equilíbrio das frustrações e desenganos.

(Cuenca, 2003, p. 32).

domingo, 22 de janeiro de 2012

Praticando o ócio criativo





Como posso escrever sobre o ócio se continuo procurando o que fazer? Eis o desafio, ou seja, como não fazer se continuo procurando o que fazer? E será que não fazendo estou criando?
Para quem sempre fez... Como é viver sem fazer, considerando que estamos condicionados no fazer desde que nascemos?

Desde os primórdios da formação das sociedades complexas, trabalho braçal e trabalho intelectual são divididos, sendo predominante a atribuição do trabalho pesado às classes menos privilegiadas, consideradas, em algumas sociedades, como inferiores. Aos privilegiados, o trabalho intelectual, o ocupar-se com as artes, as ciências, o governo, o lazer.
Na Grécia Antiga, a sociedade era dividida entre cidadãos, não-cidadãos e escravos. Os não-cidadãos e escravos eram considerados inferiores, cabendo-lhes tarefas braçais, tidas como indignas para os cidadãos. Com herança na tradição grega, os romanos denominaram ócio (otium) as ocupações com o trabalho intelectual, em oposição ao negócio (nec-otium, negação do otium), destinado a atender às necessidades de subsistência da sociedade. A dedicação ao ócio era, nessas sociedades, a atividade própria do ser humano, embora poucos tivessem acesso a ela.

E na atualidade, qual o significado poderia atribuir ao ócio?

Alguns dizem que o ócio é necessário para pensar na própria vida: “parar para pensar”. Será que paramos para pensar? Atualmente a distinção entre ócio e negócio é extremamente difícil, pois muito do que anteriormente era considerado ócio, tornou-se negócio.


Aristóteles, em seu texto Política, afirma que a escravidão somente deixaria de existir quando as ferramentas trabalhassem por si mesmas. O desenvolvimento tecnológico busca a construção de máquinas que trabalhem por si mesmas para que não precisemos nos dedicar ao trabalho braçal. Contudo, apesar de substituirmos muito do trabalho braçal por atividades executadas por máquinas, não nos preparamos para modificar nossa forma de pensar e de viver. Deixamos de ser escravos a partir da tecnologia ou nos tornamos escravos da tecnologia? 


Domenico De Masi em sua tese diz: Por que nos submeter a um trabalho torturante? Por que trabalho, conhecimento e diversão não podem constituir uma única e mesma atividade? Quando De Masi defende o ócio criativo, sua tese supõe romper a dissociação existente entre trabalho, lazer, conhecimento, realização. Não é preciso trabalhar oito horas, dormir oito horas e ter oito horas de ócio. É preciso incluir, no cotidiano, atividades que reúnam o descanso, o lazer, o trabalho e a aprendizagem.
Nesse sentido, quando assisto um filme, uma peça de teatro, um concerto, quando leio um livro, quando faço uma viagem, quando passeio pela Av. Paulista, quando escrevo um texto no computador, estou de fato exercendo o ócio criativo.
Obviamente, isso nem sempre poderá ser assim, pois caso haja uma crise fará com que as pessoas voltem a focar no elemento “colocar comida na mesa”, mas em geral pode ser útil analisar o nosso trabalho em função da Hierarquia das Necessidades de Maslow.

Nos anos 1940, o psicólogo Abraham Maslow criou uma hierarquia das necessidades humanas, geralmente representada como uma pirâmide. Na base estão os elementos básicos para a sobrevivência – comida, água, sono etc., seguidos, em uma escala  crescente, por segurança, amizade e família e, depois, para os níveis superiores de autoestima e, enfim, autorealização (coisas como moralidade, criatividade e espontaneidade.
A idéia é que você apenas se foca no níveis mais elevados quando os níveis inferiores estão supridos. Se você não tem comida, tende a não se preocupar tanto com a sua atualização, mas, à medida que a sua vida melhora e você resolve as questões de segurança e amizade, o seu pensamento volta-se às necessidades de auto-estima – e assim por diante. Maslow percebeu que os educadores devem procurar atingir a ideia de autorealização para que as pessoas sejam estimuladas a ser autênticas (“seja você mesmo”), descubra uma vocação, busquem o que há de mais precioso na vida e, acima de tudo, superem problemas insignificantes e cheguem a uma solução para as questões principais (“Não se preocupe com as coisas menores”).

É corrente a ideia que defende o ócio como fundamental à filosofa:
“pensar requer ócio” e qual seria o conceito de ócio presente nessa ideia?


Sobre o fazer Osho diz o seguinte: Fazer significa as atividades superficiais na circunferência. A coisa básica da vida não é o que fazer, a coisa básica é o que “ser”. “Ser” significa seu âmago mais profundo, “fazer” significa seu relacionamento com os outros, com o mundo exterior; e “ser” significa você total como é, sem relacionar-se, como você é internamente, Você pode ficar sem fazer nada, mas você não pode ficar sem o ser. O fazer é secundário, dispensável. Um homem pode permanecer inativo, sem fazer nada, mas um homem não pode ficar sem ser - assim, ser é a essência.

Ouvi contar: 

Mulla Nasruddin certa vez candidatou-se para um emprego. No formulário, ele mencionou muitas qualificações. Ele declarou: “Obtive o primeiro lugar em minha universidade, e me  ofereceram a vice-presidência de um banco nacional. Recusei, porque não estou interessado em dinheiro. Sou um homem honesto, um homem verdadeiro. Não tenho nenhuma ambição, eu não me preocupo com o salário; seja o que for que vocês me pagarem, estará bem. E eu adoro trabalhar – sessenta e cinco horas por semana”.
Quando o Gerente que estava conduzindo a entrevista olhou para o formulário, ficou surpreso e disse:
- Meu Deus! O senhor não tem nenhuma fraqueza?
Nasruddin disse:
- Somente uma: sou mentiroso!



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