Por que falar de ócio?
[...] Diante do mundo de evasão, distração espetáculo que nos rodeia, o ser humano se torna cada vez mais limitado, cada vez mais dependente das máquinas, menos ator e mais espectador de uma realidade irreal. Falar de ócio se transforma neste contexto, num questionamento de cada um consigo mesmo, de como ser um pouco mais livre para fazer o que se quer. (...) a vivência de ócio é uma experiência que nos ajuda a nos realizar, nos conhecer, nos identificar, nos sentir melhores, sair da rotina, fantasiar e recuperar o equilíbrio das frustrações e desenganos.

(Cuenca, 2003, p. 32).

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Quem trabalha não enriquece



“E agora, que estou livre de todas as obrigações oficiais, sinto-me atraído pela idéia de usar meu tempo e bom humor para, num desses dias, escrever um livro – ou antes, um livrinho, uma coisinha para os amigos e aqueles que partilham dos meus pontos de vista. O assunto não terá a menor importância. Será apenas um pretexto para que eu me isole a fim de gozar a felicidade de ter tempo de lazer. O importante mesmo será o tom, que deverá estar entre o solene e o íntimo, entre o sério e o brinquedo, um tom que não seja de instrução, mas de conversa amigável sobre várias coisas que aprendi...”
Hermann Hesse (O jogo das contas de vidro).

O texto acima está no prefácio do novo livro de Rubem Alves: “Variações sobre o prazer”. Quando eu estava lendo lembrei-me da máxima que diz: “quem trabalha não enriquece”.
A maioria dos assalariados não reflete sobre o motivo de uma empresa lhe pagar salário. Seria por caridade, altruísmo, generosidade? Longe disso: um empregado assalariado dedica nove, dez ou mais horas por dia para, simplesmente, enriquecer os donos ou acionistas da empresa para a qual trabalha. Passa, portanto, a maior parte de seu tempo dedicando seu suor, sua inteligência, sua experiência e seu networking para gerar riqueza para os outros.
Bem, no sistema capitalista quem tem riqueza põe essa riqueza para trabalhar e multiplicar seu capital, convidando aqueles que não têm capital para ajudá-lo nesse objetivo de multiplicar riquezas. Em troca, oferece parte da riqueza gerada, na forma de salário.
Não é por acaso que Marx compara a situação dos trabalhadores com a exploração do solo. O que ele via acontecendo ao seu redor era resultado  da submissão dos dois processos ao principio da acumulação máxima de capital.
Ou seja, tudo o que importa é pura e simplesmente o máximo da força de trabalho que pode ser utilizado em um dia de trabalho. E, alcança esse fim encurtando a extensão da vida do trabalhador, da mesma forma que um agricultor ganancioso obtém mais produtividade do solo ao roubar-lhe sua fertilidade. Ele simplesmente, está presumindo que o agricultor não apenas rouba o solo, mas também a si mesmo, ao deixar de repor algo em troca. O capitalismo puro diria que o agricultor desse exemplo será forçado a ver o erro das suas ações, pois, mais cedo ou mais tarde, as suas culturas começarão a falhar e o mercado imporá uma correção.
O problema é que como na grande escala de mercados mundiais os danos causados raramente estão tão intimamente ligados à sua causa, a tese da correção está descartada. Os mercados podem não funcionar de forma sustentável por diversas razões. A própria escala pode significar que não estamos cientes da quantidade da destruição
Você pode imaginar o tamanho de uma floresta amazônica?
Em 2005, a ONU afirmou que 13 milhões de hectares de florestas são perdidos todos os anos, mas o que isso significa para você ou para mim quando estamos em uma loja de móveis? Além disso, há problemas de a ligação entre causa e efeito ser ocultada pela distância: eu nunca estive em Mato Grosso e, mesmo que houvesse estado, seria difícil ver como a minha mesa nova em folha é resultado de algum impacto sobre a sua biodiversidade. Depois, o capitalismo tende a privatizar o capital natural para explorá-lo, enquanto os custos reais são internalizados como um problema para a sociedade em geral.

            Em resumo, o capitalismo faz um grande trabalho colhendo os lucros, mas, quando se trata de recuperar os danos, ele desaparece. Ao contrário do agricultor estúpido da história de Marx, o capitalismo global pode sempre seguir em frente. Pelo menos até que o planeta tenha se esgotado.
Baseado no livro: O Capital de Karl Marx – por Steve Shipside, “Uma interpretação moderna e prática”.
               


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